Pular para o conteúdo

Fracionamento da venda de gás, solução ou ameaça?

  • por
Tempo de leitura: 3 minutos

O GLP é um combustível amplamente usado no Brasil pois possui uma cadeia de distribuição que abrange 100% dos municípios do país. Além de ser essencial na composição orçamentária da renda do brasileiro, já que é usado como fonte de energia principal para o cozimento de alimentos de grande parte da população. Hoje a forma como o GLP é distribuído é através das distribuidoras que vendem em botijões essencialmente em um formato de 13kg para as revendas e essas revendas repassam para o consumidor final. Ou seja, ele é vendido envasado com um peso e gramatura fixas. Porém existe um projeto de lei na câmara que visa trazer uma nova alternativa  de venda do produto. De forma fracionada, através de recargas, assim como é feito com a gasolina em postos de combustíveis.

Como aconteceria a venda fracionada do gás de cozinha?

Para entrarmos nesse assunto é importante ressaltar como isso funcionaria se acontecesse. A distribuição do GLP no Brasil é extremamente organizada. Existe um órgão regulador, existe uma logística reversa altamente eficiente, existe fiscalização das embalagens, além da requalificação, tudo isso para garantir uma segurança para o consumidor final. O fracionamento de gás é uma ideia discutida há muitos anos, porém essa proposta não leva em conta esses fatores, focando apenas na redução do preço do GLP considerando que seja vendido em partes. Se o fracionamento acontecer haverá uma quebra na organização dessa cadeia colocando em risco toda a população.

Os botijões de gás hoje produzidos são utilizados, reutilizados e ainda são requalificados ao final da vida útil, o que gera um custo menor para o preço do gás como um todo, além de não serem apropriados para o enchimento fora da distribuidora. É importante ressaltar que o gasto com a compra de botijões adequados para o enchimento fora das distribuidoras geraria um aumento no preço. Outro fator relevante é que a etapa mais crítica em quesito de segurança no processo desde a fabricação do GLP nas refinarias até o momento em que o consumidor liga o fogo, é o enchimento do gás nos recipientes. E é justamente essa etapa que os inúmeros projetos querem levar para as ruas, tirando das distribuidoras toda a responsabilidade da garantia de segurança, e levando para o leigo essa responsabilidade. 

Outro fator a ser considerado é que o botijão hoje entregue ao consumidor tem uma garantia de que a quantidade dentro do botijão está correta, se o lacre da distribuidora estiver presente no botijão. E a regulação e fiscalização da ANP garantem isso ao consumidor. Se o botijão passar a ser vendido fracionado existe uma maior possibilidade de fraude da quantidade de gás vendido, assim como ocorre em postos de gasolina, que vendem gasolina adulterada, às vezes em bombas alteradas, todas essas condições dificultam a real implantação do projeto de venda de gás fracionada.

Um último fator a ser avaliado é que o brasileiro tem uma característica de não levar em conta todos os fatores legais, ou obrigatórios para uma execução adequada de alguma atividade, sempre encontrando formas criativas de trilhar outros caminhos, o chamado “jeitinho brasileiro” é uma preocupação para a execução adequada do fracionamento do gás de cozinha. Pois existe a grande possibilidade de o próprio utilizador do botijão não arcar com as responsabilidades, se elas forem lhe dadas. Não haveria como o órgão regulador atual fiscalizar cada brasileiro para garantir o uso correto do GLP. Colocando em risco assim toda a população. 

A venda de GLP fracionado é uma solução ou ameaça então?

Refletindo sobre todas as informações já apresentadas fica o questionamento do porquê esse projeto ainda tramita na câmara. A razão é a seguinte: o gás fracionado será consequentemente mais barato do que o gás que é vendido hoje, pois no mercado atual o GLP é vendido “completo” e a solução proposta é a venda fracionada.  Por exemplo: se um bolo é vendido por 100,00 reais, e o vendedor decide vendê-lo fatiado, será mais barato, pois estará vendendo uma fatia do todo. Pois aqui comparamos o valor da fatia com o valor total e a fatia sempre será mais barata nessa comparação. Essa mesma lógica se aplica para o gás.

Já do ponto de vista do revendedor, ele deverá se adequar aos novos formatos de venda, o que poderia implicar num investimento consideravelmente mais alto do que é feito hoje para a abertura de uma revenda, novos equipamentos, maior gastos com funcionários pois possivelmente deverá ter um “frentista” de gás para fazer as recargas, para receber em troca um nível de segurança muito menor que ainda poderá resultar em acidentes de trabalho. Outro cenário que poderá acontecer é o aumento de revendedores clandestinos com a fiscalização prejudicada, clandestinos vendendo um botijão de 8kg com apenas 6kg, poderá se tornar algo comum. 

Então compreendemos que a venda fracionada de GLP não é uma solução viável, mas sim uma ameaça tanto para o consumidor quanto para o revendedor. Ao transferir responsabilidades críticas de segurança e fiscalização para pessoas menos preparadas, abre-se espaço para fraudes, acidentes e a desorganização de uma cadeia que hoje funciona de maneira eficaz. O risco de redução na segurança, aliado ao possível aumento de revendedores clandestinos, torna essa proposta uma ameaça real para a integridade do mercado e a segurança da população. 

Referências:

PL 987/2022

PodCast DuGás – Episódio#4 – O mercado de GLP no Brasil 

25 a 33 minutos 

42 a 1:00h minutos

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

pt_BRPortuguês do Brasil